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Foto do escritorAna Brisio

A mais louca corrida do mundo





Quem me conhece ou me acompanha, sabe que eu me reservo e não partilho nada da minha vida pessoal nas redes sociais. O que acontece em Vegas fica em Vegas, dizendo com isso que o que acontece na minha casa fica na minha casa.


Fruto dos inúmeros casos que me têm chegado, que em alguns ou muitos aspetos me remetem a uma experiência vivida em família, dada a sua importância e delicadeza, decidi levantar um pouco do véu do que aconteceu em Vegas.


A minha filha, na altura com 6 anos, dera início ao seu percurso escolar havia poucos meses. Lembro-me que era um dia de Inverno quando chegou a casa com uma missiva da professora, via caderneta, solicitando a minha presença na escola, com a maior brevidade possível, para falar sobre o desempenho da minha educanda.


Apanhada de surpresa e sem a menor ideia do que poderia ter levantado tal bandeira vermelha, desloquei-me, logo no dia seguinte, ao estabelecimento de ensino para me colocar a par dos acontecimentos e resolver o que tinha que ser resolvido.


Encontrei a professora num misto de desespero e frustração. “Já tentei de tudo para chegar à Rita”, disse-me. “Já gritei, coloquei-a de castigo, ameacei, falei baixinho, falei e bem e a mal, já fiz de tudo e nada resulta”. Continuou: “Ela fica sossegadinha no seu lugar, com o olhar vago a pensar no dia de ontem e quando lhe pergunto alguma coisa, suspira e olha para mim como quem diz: hoje não me apetece.”


Feitos os desabafos e apresentados os factos, veio a recomendação que passava por procurar auxílio de um psicólogo, pois algo anormal se passava.

Como podem calcular, fiquei com o coração nas mãos e rapidamente demos inicio à mais “louca corrida do mundo”.





Começámos por levar a Rita a uma psicóloga. Após a avaliação, deu-se início a acompanhamento psicológico, o que ocorreu durante dois anos e meio. Durante este período, pouco ou nada mudou e com o passar do tempo, levantou-se a suspeita de dislexia fazendo com que a escola indicasse a Rita para acompanhamento em ensino especial sugerindo que também a levássemos a um centro especializado na avaliação e acompanhamento de crianças com dificuldades de aprendizagem – o que fizemos.


Procurámos informação, escolhemos e dirigimo-nos a um centro especializado e conhecido (mas cujo nome não posso revelar). Após uma consulta com o profissional responsável e alguns testes depois, obtivemos o verídico de deficit de atenção, dislexia e discalculia. Juntamente com o diagnóstico, veio a recomendação de a Rita ser acompanhada por professores da própria instituição e uma receita médica com a solução milagrosa.



Quanto à dislexia, tudo bem, não seria caso único na família. Em relação à discalculia, agora questiono pois a Rita chegou a ser considerada a melhor aluna de matemática da sala. Já em relação ao deficit de atenção, só poderia ser um deficit seletivo, pois era capaz de ficar sossegada e focadíssima quando via desenhos animados ou estava a braços com uma tarefa do seu interesse.


Após grandes hesitações e sem saber o que seria pior para Rita, se o efeito do medicamento receitado (cujo nome também não posso revelar) ou a baixa autoestima, derivada das dificuldades e inaptidão no processo de aprendizagem, optámos pelo medicamento. Em relação ao apoio na aprendizagem não questionámos.


Tomou o medicamento durante dois meses, o tempo suficiente para que Rita o batizasse de Viki, (nome de um personagem de desenho animado de que gostava muito) e o considerasse seu amigo e aliado.





Conscientes da problemática de uma dependência psicológica e emocional, decidimos colocar o Viki de lado e manter o resto do plano em andamento.


Na verdade substituímos um desconforto por outro. Agora, a sensação de deslealdade pairava, já que todos contavam que a Rita estivesse medicada…


A vida prosseguiu com a presença regular da Rita nas sessões de apoio e quando íamos à consulta de acompanhamento, o médico satisfeito com os resultados, passava nova uma receita de “Viki” pois o mesmo mostrava-se eficaz… andámos nisto cerca de mais ano e meio.


A corrida não terminou por aqui. Muitas mais voltas foram dadas, que agora vistas à distância e com outra consciência, umas parecem caricatas, outras absurdas e noutras reinou a sensatez.


Pelo caminho observei, aprendi e arrependi-me de algumas coisas, nomeadamente do facto de ter permitido que tantos rótulos fossem colocados num ser que se revelou ser inteligente, responsável e trabalhador, pois foi inevitável que a Rita sentisse sobre si, o peso da sombra que algo não estaria bem. Desmistificar essa ideia foi um trabalho árduo que deu frutos.





É frequente aparecerem-me pessoas das mais diversas faixas etárias, com questões que se prendem com o processo de aprendizagem. Falta de foco, confusão, dificuldade de raciocínio ou em lembrarem-se do que leram e aprenderam, são algumas das queixas apresentadas. Tudo isto, associado às expectativas próprias ou de terceiros, cria um cocktail detonador de qualquer hipótese de sucesso.


Memória, crenças e emoções ligadas à escola, relacionamentos, Bullying, professores, expectativas, formas de ensino bem como as apetências próprias do indivíduo, são apenas algumas das causas, mais que suficientes, para comprometer a aprendizagem e condicionar toda uma vida, já que os seus efeitos ultrapassam a esfera do saber e do fazer mexendo profundamente com a auto-imagem.


A par do desbloqueio emocional e pacificação com a envolvente, há que averiguar a condição da saúde física. A Medicina Tradicional Chinesa, encara o indivíduo como um sistema integrado em que o espiritual, mental, emocional e físico estão interligados, cada um deles dando o seu contributo nos vários processos de


vida. Quando a capacidade de raciocínio, lógica e memória da aprendizagem estão comprometidos, devemos colocar o baço e o sangue sob a mira das nossas investigações.



Questiono, até que ponto a falta de atenção dada a este importantíssimo órgão, pela medicina ocidental, não será um dos fatores que em muito contribui para que problemas como os referidos, sejam tão generalizados na nossa sociedade atingindo miúdos e graúdos.



Depois de tudo isto, a minha filha prepara-se para voltar à escola primária, agora como professora empenhada em fazer a diferença e eu sei que assim será.





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